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Da Cultura ao Inconsciente Cultural - Análise Ilustrada

Redação: Rochelle Alberti e Henrique Solé
Direção de Arte: Rochelle Alberti
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Peças ilustrativas referentes ao texto de Fernando Cesar de Araújo "Da Cultura ao Inconsciente Cultural: Psicologia e Diversidade Étnica no Brasil Contemporâneo" (2002). Os escritos a seguir referem-se a interpretações feitas pelos graduandos de Psicologia Rochelle Alberti e Henrique Solé. O texto na íntegra pode ser lido através do link: http://www.scielo.br/pdf/pcp/v22n4/04.pdf
            Uma dúvida levantada por Araújo em sua abordagem inicial, instiga o leitor a uma reflexão sobre o papel da psicologia no mundo pós-moderno e a sua sobrevivência no mesmo. Não se mostra necessária uma leitura investigativa de todo o conteúdo, uma vez que nos parágrafos introdutórios a resposta é evidenciada. Ela não apenas sobrevive, como assume papel vital no que tange a auxiliar os indivíduos na construção e entendimento de sua identidade mosaica, permeada por influências diversas. Destacam-se aqui: cultura, sociedade e repertório do próprio sujeito. Ademais, a disciplina agrega à sua função a tarefa de averiguação do “externo” (no sentido cultural, folclórico), e não mais se contenta – como também se mostra insuficiente – enquanto se limita a análise do inconsciente individual. 
            No texto em questão, o conceito adotado “globalização” afasta-se do geográfico, comumente utilizado fora da esfera dos estudos psicológicos. Infere assim que, “Globalização é o deslocamento de bens culturais primariamente locais, cruzando fronteiras e movendo-se através das paisagens, o que provoca a percepção da globalidade” (Segato, 1997).
As Consequências da Globalização
             A partir de tal definição, torna-se nítida a necessidade de compreensão da diversidade étnica existente em um determinado espaço simbólico, tal qual a necessidade de atenção para questões relativas a identidade e o eminente risco de perdê-la, tendo em vista que, em um mundo de mutação acelerada, o fenômeno de globalização atua como “um processo de decomposição e recomposição e identidades individuais e coletivas”.
            Ressignificando a famosa obra de Pablo Picasso, “Guernica”, que em seu sentido original enuncia os horrores provindos de bombardeios alemães na cidade de Guernica  durante a Guerra Civil espanhola, na interpretação dos graduandos, as bombas metaforizam o processo de globalização, que por sua vez dilacera os símbolos e a identidade dos sujeitos, referenciados no quadro pelos corpos animais e humanos, mutilados em agonias e desespero, como representação da fragmentação das culturas e etnias, que, perdidas de sua referência material, agonizam em um limbo de incerteza sobre como e por quem serão apropriadas.
A Identidade e o Peso do Afeto nas Relações Humanas
            Segundo Marc Augé (1998): “Se o tema do racismo, da alteridade e aceitação do Outro transita pelo afeto, está, portanto, imerso num campo primariamente psicológico. E se o conflito inter-étnico é derivado de um medo da dissociação e da perda de identidade, o verdadeiro trabalho dos psicólogos é examinar os fundamentos da nossa identidade.” Sendo assim, a superação do racismo se torna possível apenas quando elucidada no campo afetivo da relação, através de uma “aproximação” simbólica com o ser diferente, que por sua vez assume o papel do negro no Brasil, tendo em vista que, apesar de representar a vivicidade da história e da cultura que deu nos origem, ainda é visto como Outro.
           Evidencia-se assim, a intima relativização do racismo ligado a relação afetiva entre as partes envolvidas. Conclui-se então, que a impessoalidade levaria a relações mais tóxicas e permeadas pelo preconceito e pela falácia da superioridade etno-cultural provinda de pensamentos evolucionistas.
Imaginários Colonizados e a importância da cultura imaterial
            No caso do Brasil, especificamente, desenrolou-se uma maciça e desenfreada colonização, não apenas no campo físico com os trabalhos forçados, destruição de aldeias indígenas, captura e comercialização de escravos africanos, como também no aspecto cultural, através da catequização e imposição do imaginário europeu que pregava, inclusive, a subjugação das etnias dominadas. Essa dominação era respaldada por teorias cientificas da época: Fardo do homem branco, Missão civilizatória e mesmo a Teoria do criminoso nato.
           Nesse período, a colonização de imaginários se dava ainda na África, com a proibição de transporte de pertences, materiais pessoais e qualquer artefato que remetesse aos escravos o seu país de origem. Além disso, ressalva-se o fato de que foram vetados nas colônias todo e qualquer tipo de culto religioso de origem africana. Contudo, costumes culturais imateriais não são passiveis de fiscalização, sendo assim, o conteúdo imaginário do homem negro resistiu, isso se mostra evidente através do fusionismo de religiões, como o candomblé, e os rituais implícitos através da dança.​​​​​​​            
           Essa resistência possibilitou a transmissão e a reformulação de valores culturais, o que explica, por exemplo, a popularização e o empoderamento de membros do candomblé e sua consequente expansão. A pratica cotidiana dos valores comunitários, “do corporal, do mítico, da memória coletiva, do ficcional, do encantamento.
O Mal Estar
            Após a exposição de problemáticas ligadas a questões identitárias, simbólicas e culturais, aborda-se no texto a importância da discussão do tema étnico-cultural entre profissionais da saúde mental em âmbito clínico. Acrescenta-se aqui uma reflexão da dupla responsável por este projeto quanto a importância da abordagem temática também em âmbito acadêmico, uma vez que, imersos e conscientes sobre os tópicos acima citados, os estudantes desfrutarão da possibilidade de pesquisa e fomentação teórica acerca do tema.
            Araújo ainda ressalta e lamenta o “esquecimento” a qual parece fadada a questão étnica. Destacam-se também as evidências preocupantes provindas desta problemática, que se converte em sintomas sociais frequentemente levados à clínica – como o comportamento agressivo -, resultantes de um processo de repressão de tais questões.
            Por fim, questões relativas ao âmbito dos profissionais de saúde mental são levantadas, tais como: a baixa atuação de psicólogos e psicólogas negras na clínica, tal qual nas universidades, a eficiência (ou ineficiência?) da preparação profissional para o atendimento de pessoas negras de baixa renda, assim como a escassez de palestras e congressos relativos ao assunto.

Subjetividade
            É importante lembrar que nem sempre o mesmo símbolo carrega os mesmos significados, isso ocorre devido a históricos de interações sociais e culturais diferentes em cada indivíduo. Para efeitos didáticos, essa relação pode ser imagetizada na realidade indiana, onde a vaca é tida como símbolo sagrado, enquanto que na maioria dos países ocidentais o mesmo animal é sinônimo de alimento, esvaziado de qualquer significado místico ou mesmo religioso.
            Para Araújo, a importância da investigação “intrapessoal” psicanalítica é exemplificada através da apresentação de processos patológicos, como a histeria ou regressão, que, quando analisados de forma puramente pessoal (inconsciente) descartam possíveis aspectos importantes para a vida do indivíduo afro-descendente, tais como a crença da manifestação divina no estado de transe.​​​​​​​
Inconsciente Coletivo  
            Para Jung “Há diferenciações correspondentes à raça, a tribo e família, além da psique coletiva ‘universal’”, ou seja, as questões do inconsciente seriam produtos dos arquétipos (em sua totalidade, naturais). Apesar da desconsideração cultural, há de se dar o mérito ao autor no que diz respeito a preocupação com a possível deficiência da análise inconsciente pessoal, que na época da escrita era dominante entre os psicanalistas.
            Partindo da mesma tese, Jolande Jacoby acrescenta à teoria Junguiana uma representação visual do que seria o inconsciente coletivo, o descrevendo como uma árvore genealógica. Esta, por sua vez, recebeu várias críticas, uma vez que certos grupos culturais seriam julgados inferiores.
Inconsciente Cultural
            As definições de inconsciente cultural emergem como alternativa funcional aos conceitos previamente atribuídos ao chamado “inconsciente coletivo”. Os teóricos a serem levantados na referente discussão são: Joseph Henderson, Fanon e Ramos. Para o primeiro, o inconsciente cultural estaria, topograficamente falando, situado entre o inconsciente coletivo e o inconsciente pessoal; Fanon, por sua vez, vê o inconsciente cultural representado em situações de divergência étno-cultural, tal como as relações do negro para com o branco, nas quais o primeiro sofre por não ter a cor de pele dita “superior”, a medida que a dominação racial acontece e se extingue toda a originalidade negra de si, na esperança de se reconhecer humano. Arthur Ramos por outro lado, desvia dos aspectos negativos acima citados e dirige seus esforços ao estudo da permanência de elementos centrais da cultura africana, que resistem no “folclore” e no imaginário, contribuindo assim para a manutenção e reformulação do imaginário coletivo negro.
Self e Cultura
            ​​​​​​​Por fim, conclui-se que a comunidade clínica e acadêmica de saúde mental, em tempos de globalização - que acarreta no estreitamento espaço-tempo - deve se manter atenta e fomentar a discussão sobre a importância da consideração da análise de imagens arquetípicas como também aquelas adquiridas através da cultura. Percebe-se assim uma possibilidade eficaz de tratamento, que leva em consideração o self e o cultural, no momento de análise e observação do problema que leva o paciente a angústia. Deixar de lado a subjetivação da cultura é o caminho para uma prática mais humana/social que contribui para a superação de preconceitos seculares.
Obrigada pela atenção!
Da Cultura ao Inconsciente Cultural - Análise Ilustrada
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