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CONCURSO A0=MODERNISMO x (BRASIL + LE CORBUSIER)

2019 | Concurso A0=Modernismo x (Brasil + Le Corbusier) - Instituto Cremme

      Le Corbusier propõe, no início do séc. XX, uma fissura no pensamento urbanístico. Inserido em um panorama urbano de transformações culturais, territoriais e técnicas, onde o crescimento volátil e desenfreado das cidades dava início a questionamentos sobre a sua racionalização, o arquiteto propõe um modelo baseado no ordenamento projetual, racional e
articulado à geometria. 
      Com projetos utópicos e abstratos, que vão desde o Plan Voisin para Paris às diversas experiências na América Latina (Buenos Aires, São Paulo e Rio de Janeiro), Le Corbusier difunde ideias semelhantes em contextos dos mais diversos, contribuindo para o surgimento dos CIAMs, congresso que propunha a criação de um “modelo” urbano universal e que deu origem a Carta de Atenas, documento dogmático com conteúdo desprovido de qualquer valor simbólico e cultural. Em meio às discussões sobre os problemas urbanos do período, os arquitetos faziam uso das fotografias aéreas, que não só revelavam uma nova perspectiva até então desconhecida, como também permitiam a apreensão das cidades em sua totalidade, utilizando- se de uma escala que não distinguia a casa, a rua e as relações entre as pessoas. Essa nova visão da cidade configurou-se como um novo instrumento de controle nas mãos do planejador.
      Diante dessa reflexão, é impossível não correlacionar os conceitos de Le Corbusier e as diretrizes da Carta de Atenas com a cidade de Brasília, a concretização da utopia moderna, erigida sob o preceito da tábula rasa. Partindo de um desejo de confrontar o planejamento urbano e a dinâmica social da cidade de Londrina-PR com os preceitos modernos de Brasília, a fim de encontrar resquícios do pensamento de Le Corbusier acerca da cidade funcional e das diretrizes da Carta de Atenas, identificamos que o que vivemos no dia a dia, assim como ocorre na grande maioria das cidades brasileiras,
é oposto no sentido do planejamento.
      Londrina, apesar de ter sido concebida a partir de uma planta inicial, não foi planejada formalmente como Brasília, cresceu rapidamente e possui uma urbanização como consequência de algum raciocínio, uma intenção, talvez como produto do lucro, da especulação imobiliária. Apesar de princípios opostos, ambas as cidades acabam sendo excludentes, fazendo com o que
o ambiente urbano atue como um vetor de exclusão e segregação espacial.
      Buscando reviver a experiência do pensamento de Le Corbusier e da Carta de Atenas e encontrá-los em aspectos do nosso cotidiano, reconhecemos outras características análogas à Brasília quanto ao desenho urbano, mesmo que por vezes esses elementos do urbanismo moderno se assemelhem apenas em sua essência. Identificamos em Londrina grandes avenidas que se assemelham a auto-estradas, representadas apenas pelas vias estruturais que cortam a cidade. Prédios altos e dispersos em espaços verdes vazios também são encontrados aqui porém, neste caso, concentrados atrás dos muros dos condomínios fechados que ocupam quadras inteiras. Além disso, a divisão de funções corbusiana acontece com uma nova finalidade, marcada pelo fenômeno do urban sprawl, caracterizado muitas vezes pela destinação de moradias populares distantes do centro, em áreas de uso exclusivamente residenciais, originando um grande movimento pendular em direção à outras áreas da cidade.
      Partindo dessa crítica em relação ao urbanismo moderno e ao planejamento urbano atual, é evidente que, desde o início do séc. XXI, momento em que Le Corbusier propõe uma fissura no pensamento urbanístico, uma elite acadêmica considerada detentora de um saber científico propõe diretrizes, julgadas como superiores quanto aos melhores caminhos para a apropriação dos espaços sociais. Por outro lado, a população que não possui outra alternativa, se não aceitar essas imposições, criam mecanismos de superação a partir da atribuição de novos significados, incorporando os espaços ao seu cotidiano.
      Como base nesse pensamento, buscamos com essa instalação confrontar diferentes perspectivas e escalas, contribuindo com a reflexão acerca de um urbanismo mais humano e sensível às relações interpessoais na cidade. Um grid com dimensões de 1,5mx1,5m materializa o ordenamento projetual e racional proposto por Le Corbusier. Sobre ele, blocos estandardizados, resultantes da divisão de uma A0, simbolizam a aplicabilidade universal proposta nos CIAMs e convidam o visitante a experimentar uma projeção da cidade a partir do ponto de vista de um pássaro, de cima para baixo, símbolo do olhar hierárquico de arquitetos e urbanistas que desenvolvem o projeto como um ato “divino”. 
      Em contraposição a essa visão, monóculos fotográficos suspensos sob a estrutura principal da instalação estimulam o visitante a enxergar a cidade a partir de um novo ponto de vista, desta vez na escala do pedestre. Através de diversas imagens da cidade de Londrina, buscamos direcionar o olhar do planejador para as especificidades dos espaços sociais da cidade e a sua relação com a população, pois acreditamos que é através da atribuição de novos olhares e narrativas que o ambiente urbano pode ser transformado.
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