Certos incômodos que carregamos passam desapercebidos por serem completamente normalizados em nossas vidas desde muito pequenos. Quando comecei a ter ferramentas para compreender esses incômodos, descobri que poderiam ser uma construção que se tornou quase um padrão em grande parte do país, o ambiente urbano brasileiro.
Prédios e ruas enormes, monumentos imensos, grandes distâncias, quantidades de pessoas que não conseguimos imaginar de fato, tudo desenhado para favorecer carros e o mercado imobiliário, percebi que eram parte do meu incômodo, mas algo além ainda me machucava no dia a dia ao simples fato de caminhar na rua.

Andando de bicicleta outro dia, senti o susto que quase todo ciclista brasileiro já deve ter sentido alguma vez quando um carro passa em alta velocidade há poucos centímetros de distância, nesse momento ficou muito claro pra mim o que faltava compreender sobre minha aversão aos espaços comuns destas cidades, as escalas de velocidade. Tudo que o ser humano tinha próximo de si por 200 mil anos raramente passava de 30km/h, ao meu ver parece compreensível que parte do nosso estresse de viver em cidades completamente construídas para carros como ainda são grande parte das do Brasil acontece por essa dissonância, vivemos desviando de carros, parando para que passem, com medo deles.
     Desde então passei a estudar ocupações de povos que não inseriram carros nas suas comunidades, nativos americanos, comunidades variadas no continente africano, Quilombolas brasileiros e não foi difícil perceber que ao natural sem imposições, as pessoas gostam especialmente de criar seus caminhos, quase sempre orgânicos, encurtando trajetos ou passando por pontos de interesse, me questionei se nos organizarmos de maneira mais orgânica poderia afetar nosso bem estar.
 
O projeto a seguir é um estudo pessoal de possibilidades de organização que possam respeitar o nosso desejo profundo de criar nossos próprios caminhos, sem tanto contato direto com veículos em alta velocidade, trajetos pedonais nas áreas centrais das quadras unidos a áreas de estar e lazer que cada quadra poderia oferecer sem o excesso de movimento e barulho das ruas. As moradias também se viram para os pequenos parques nos centros das quadras promovendo um ambiente mais seguro onde os próprios moradores fazem a observação dos espaços comuns ainda que tenham sua privacidade preservada pelo recuo das varandas.
 
Jardim de Morar
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