Independente da sua ideologia política, O mecanismo não é o tipo de série que deva ser ignorada. A obra liderada por José Padilha e Elena Soarez, pode até não ter a qualidade e o requinte de House of Cards, mas está cheia de discussões interessantes e não nos deixa perder a magnitude do que é abordado.

A segunda temporada iniciou exatamente no ponto onde a primeira acabou, com os agentes federais comandados pela delegada Verena Cardoni (Carol Abras) em busca do masterminder do cartel de empreiteiras, Ricardo Bretch (Emílio Orciollo Netto). As sequenciais deixam claro que a roleta russa de Padilha e Soarez é indiciadora e, a essa altura, não sobra “pedra sobre pedra” de quem quer que esteja no castelo de cartas montado a décadas pelo esquema de corrupção brasileiro.

Diferentemente da temporada inaugural, o agente Marco Ruffo (Selton Mello) foi colocado no centro das atenções pelos roteiristas, assumindo uma imagem de lobo solitário que não “larga o osso” mesmo não sendo mais da Polícia Federal e ainda assim perdendo sua esposa e filha no processo. Se na primeira houve uma tentativa de “esconder” esse personagem, agora é ele quem faz as peças do quebra cabeça se moverem, a partir da localização da secretária do esquema de propinas de Bretch e trazendo-a a depor. Mas existe quase uma obsessão em relação ao seu real alvo, Roberto Ibrahim (Enrique Diaz), um sujeito tão escorregadio que se enquadra como uma estrela vilanesca. A temporada tentou montar Ricardo Bretch como um grande vilão com direito a uma mansão minimalista, inteligência anormal e uma “poker face”, mas é Ibrahim quem traz cor e dinamismo, roubando a cena com um jeito malando tão bem interpretado por Diaz.

Outro ponto importante é que a série ainda não conseguiu desapegar da linha didática extrema, o que por um lado é algo bom como “função social” para explicar os esquemas aos espectadores nacionais ou internacionais, considerando que é uma série Netflix. Porém, como conteúdo de entretenimento a intenção de explicar tudo minunciosamente de modo que nada seja deixado nas sombras da dúvida é um fator desvantajoso. Não há dúvidas de que as falcatruas precisavam ser explicadas, mas há falta de sutileza ou até mesmo originalidade, tudo é movido como uma linha reta na base de uma narração muito longe de emprestar uma atmosfera noir, o que nos traz um bis in idem extremamente irritante.

Apesar de tudo, a segunda Temporada de O Mecanismo conseguiu superar a anterior por trazer mais foco a ação investigativa e oscilar entre esses dois grandes vilões de personalidades opostas (Bretch e Ibrahim) dentro de um cenário mais apavorante. A série é o que eu chamaria de “Favor aos leigos” e perpetua uma conversa urgente, principalmente aqueles quem traz pontos de vistas convenientes aos seus.

O Mecanismo (Brasil, 10 de maio de 2019)

Showrunner: José Padilha, Elena Soarez.

Direção: José Padilha, Daniel Rezende

Roteiro: Elena Soarez (baseado em obra de Vladimir Netto)

Elenco principal: Selton Mello, Caroline Abras (Carol Abras), Enrique Díaz, Otto Jr., Jonathan Haagensen, Antonio Saboia, Lee Taylor, Leonardo Medeiros, Susana Ribeiro, Osvaldo Mil, Anna Cotrim, Emílio Orciollo Netto, Helena Ranaldi, Karla Tenório

Duração: 383 min. (8 episódios no total)